sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Aniversário

 Depois de crescido eu esqueci como se comemora aniversários. Não tenho ânimo pra chamar as pessoas, bater um papo, jogar conversa fora. Isso já é difícil normalmente, mas no aniversário é bem pior. Mas é uma das coisas que eu não sei onde eu me perdi também. Já tive a época que não falava pra ninguém meu aniversário e ficava esperando as pessoas lembrarem e me darem parabéns, pra me sentir importante. Demorou muito muito tempo e muitos aniversários sofrendo sozinho pra perceber que a vida das pessoas é muito mais do q ficar lembrando aniversário de amigo desnaturado. Então, depois de um tempo, eu mesmo passei a alertar todo mundo, pedir parabéns, pedir presente, pedir atenção e abraço. Minha vida de um aniversário pro outro, mudou. Era o pouquinho de carinho que eu precisava ali, pra dar um balde de cimento na carência, conseguir esquecer um pouquinho das coisas e só ficar feliz, pelas pessoas estarem felizes, por um dia ali. 

Hoje, no entanto, minha memória resolveu me levar pra o inferno astral que foram meus aniversários em solidão. É incrível como meu cérebro tem me levado cada vez mais pra esses lugares, reviver essas coisas que eu precisava esquecer, mas lá estou eu, buscando atentamente as respostas das perguntas que eu não fiz, pra tentar sair daqueles lugares e não voltar. Minha bagagem é imensa. Ela me pesa os lados, o peito, me aperta todo. A dor e a tristeza que vem juntos são desconfortáveis demais. Mas eu chafurdo, me belisco, observo a memória, bebo absolutamente todo esse vinho amargo, pra que não tenha mais safra pros próximos anos.

Meu aniversário já foi um inferno astral fortíssimo. Um castelo que eu construí na base da ignorância e do egoísmo. É a vontade de interagir e de ser amado, batendo de frente com a loucura da insensatez, de não entender o outro, sequer tentar se colocar na posição do outro ponto de vista. Hoje eu sei que eu sou bem mais empático do q eu já fui, até demais, mas antigamente era difícil reconhecer humanidade. Ver as situações de fora, se tirar da equação, aprender que nem tudo, por menor ou maior que seja, é sobre a gente e sobre as nossas escolhas. Se tirar das situações pra mim, foi uma das maiores provas de amor próprio que eu me dei, se dar ao trabalho de entender que o mundo não é nosso umbigo. 

Mas nesse buraco, eu só via eu, e só via minha dor, e só via como o mundo era cinza demais pra eu ter um bom fevereiro. Eu já te perdoei por muita coisa, mas não acho que me perdoei por toda a dor colateral que te causei.

A parte chata é saber que eu preciso me perdoar pra esquecer, mas ainda acordar com a taça cheia de memórias amargas. Eu consigo? Talvez. Eu quero? Demais. Eu vou? ...

...

...

Feliz aniversário, Marcelo.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024

Sensação estranha

 Quando eu fechei o portão e me preparei pra dar o segundo ou terceiro passo, eu parei. Muito rapidamente meu cérebro me disse que eu havia esquecido algo. Eu fechei minha mão direita e senti falta do atrito. Um milésimo de segundo de culpa depois, o alívio veio. Eu não precisava me preocupar mais com isso, e já faz um bom tempo que vivo assim.

As vezes eu me surpreendo com a capacidade do meu cérebro de lembrar coisas e sentir falta de pequenos detalhes que eu já forcei que fossem apagados. É incrível como a sensação vem crua, fortíssima, pra no mesmo instante ir embora.

Eu me peguei sorrindo, pensando nos bons momentos, mas passou rápido. O veneno da nostalgia é doce, mas eu sei bem o que acontece quando ele preenche as fissuras da minha alma. Temos todos textos explicando como a areia foi embora e agora eu estou cheio de muita coisa mas nada demais. 

Eu fechei a mão e me forcei mais uma vez a lembrar, de que eu não tenho nada lá. 

Eu não preciso sentir isso.

E eu me pergunto se você vai demorar a aparecer.