terça-feira, 28 de junho de 2022

insônia

 São dez da noite. Estou cansado. Bocejo. Desligo o computador. Escovo os dentes. Me arrumo. Apago as luzes. Deito na cama. Dou uma última checada no celular. Coloco uma música pra ajudar a dormir.


As pálpebras estão fechadas. A respiração constante. O cérebro manso. Mais bocejos. O sono está do meu lado. O corpo confortável. 


Já fazem alguns bons minutos que não me mexo. Respiro mais profundamente. A música está bem baixinha, pro subconsciente tomar conta. Alguns pensamentos começam a querer sair do cercadinho.


O celular para de tocar a música, e o tempo do sleep era de 45 minutos. Ainda estou na mesma posição que deitei. A respiração constante, o corpo cansado. A idéia de que se passaram 45 minutos e o sono não veio, trás frustração.


Troco de posição. Troco o lado do travesseiro. Me espreguiço. Bocejo novamente. O cérebro manda o primeiro porquê.


Por quê não consigo dormir?


Os barulhos da rua já estão bastante proeminentes. Os passos das pessoas na passarela pela madrugada. Vozes, gritos, carros. Por quê não consigo dormir? Em uma derrota, olho o relógio, e são 1 da manhã. Se foram 3 horas de absoluta paz, tranquilidade e conforto. O golpe da frustração acerta profundamente. Por quê?


O corpo começa a dar sinais de desconforto. As cobertas ficam quentes. O travesseiro arranha. Por quê? Suspiros. Respiração profunda. Contar carneiros. Por quê? As lágrimas chegam e trazem fúria. Não há mais paz. A tranquilidade se foi. O barulho baixinho da garganta permeia. Em outra derrota no relógio, são 3 da manhã. Por quê?


O corpo que estava cansado já está mais do que destruído. A escuridão do quarto quase ausente, com os olhos acostumados. Por quê? O corpo esfria sem a coberta. Por quê? Calor, tristeza, inércia, dor e dor e dor. Por quê? Os primeiros raios de sol entram pela janela. O grito mudo no travesseiro. Por quê? 


O olhar vazio para as paredes não responde nada. Os olhos abertos ou fechados não fazem diferença. Por quê? São 8 da manhã. Eu não consegui dormi. E a frustração me enche de lágrimas e de amargura. Por quê?

Ter a noção de que eu não consegui dormir, me preenche de melancolia. Eu não fui apto. Não fui capaz. Eu queria. Mais do que muita coisa. 


Eu não 

consegui 

dormir.


Por quê?

quinta-feira, 16 de junho de 2022

Carta para as cinzas

Esse texto foi uma carta que meu personagem de RPG de vampiro: a máscara, Sean, um Ventrue de alguns séculos, escreveu quando teve seu frágil mundinho abalado por uma paixonite. 

Há quase 10 anos.

Certas coisas são cíclicas na nossa vida mesmo.


04/01/2013


Domingo, Buffalo


23h, Isa's Girls

Eu... mal te conheci. Uma fama nada agradável precede-te, ouço de bocas inebriadas sobre suas incríveis habilidades, sobre o verdadeiro amor que é possuir-te, sobre quantas vezes já o fora...


Era uma obrigação conhecê-la, sondar sobre tuas atitudes e desejos, e o porquê de Buffalo, dentre todos os lugares. Minha vez então se aproximava, e poderia ver com meus próprios olhos o que havia de tão especial no teu colo...


Acredito que quando vi-te, meus olhos não lhe fizeram justiça. Por ser boêmio, esperava que fostes apenas um rostinho bonito, tentando formas alternativas para fazer dinheiro rápido, e pelo que ouvi, muito rápido...


Mas estava pasmo. Como, por tudo que ainda me atenho nesta pós vida, podia ser tão... perfeita? Não precisavas dizer nada, teus olhos comunicavam perfeitamente o que querias de mim, apenas perfurando-os. Não sabia o que dizer, como agir, e em toda minha experiência, isto fora impossível.


Quando se aproximou, tive medo da rapidez de nosso encontro, e quis que perdurasse para sempre este, em um quadro... pensei. Mas o sangue falou mais alto. Meu objetivo voltou com voracidade e clareza. Coloquei meu melhor sorriso, e analisei cada detalhe seu, de seus lábios, seus olhos, sua voz. O quê você busca, o que você almeja.


No momento em que notei teu desvio, aquela pequena faísca de medo e desespero em seus olhos, senti que minha hora havia chegado. Prontamente me propus a te libertar da dor, gostaria de vê-la livre, quiçá cobiçá-la eu mesmo...


E sua inocência foi sua ruína. Como, em nome de Cain, podes ser tão estúpida? Disse-lhe para confiar totalmente em mim, exigi de ti somente a verdade, mas seu desespero e seu amor lhe tomaram. Sua mente não estava mais aqui, quando mencionei que tinha condições de ajudá-la. 


Eu não tenho coração. Definições mundanas de sentimentos, apego e cuidado, são tão vãs que nem faz ideia. Talvez nos próximos séculos. Mas hoje eu me perdi. Talvez, sua ingenuidade tenha me contaminado, e esqueci o que eu era para tentar ajudar-lhe. Agora apenas agonizarei eternamente, mudo para o mundo, sobre o que fez com este pobre monstro.


Antes de entrar naquele cômodo, pensava em como iria reagir, o que você faria ao conhecer seu amado... Inveja. Um sentimento há muito perdido, e que confesso, chegou próximo a superfície do meu ser, uma criança da noite literal, sem qualquer pudor e apreço pela pós vida, alguém marcado por uma busca fantástica em um mundo severo e acimentado.


"Trouxe a garota. A mesma busca um sonho, por isso chama tanta atenção. Peço que perdoe a ingenuidade da criança, e que apenas a escute."


Tão automático, tão fiel, tão cegamente obediente. A verdade é que queria poder começar a te servir logo naquele momento, que fosse designado para ser seu guardião e tutor, pois tudo que tu representava, era tudo que eu havia me forçado a esquecer. Causaste um turbilhão aqui dentro, mas nunca iria saber. Nunca.


"Buscas tão infundadas quanto a impossibilidade de seu objetivo. O passado que é ressuscitado pelas mesmas, deve e será para sempre enterrado."


Foi tão rápido. Em um segundo, estavas ao meu lado, se agarrando ao meu braço, como se somente isso lhe desse calma. No outro, estava completamente em chamas, e em um segundo a mais, deixaste de existir.


Assim, tão fugaz. Tão humana.


As perguntas vieram aos montes, dúvidas, por quês, mas nada disso seria importante. Todos os dizeres que ocorreram a seguir foram ignorados pela razão e por isso não terão o trabalho de serem reproduzidos. 


Farás parte de mim, indefinidamente, eternamente. E quero imaginar que alcançou tua liberdade.


Nunca havia sonhado em meu descanso. Afinal de contas, por quê haveria eu, um monstro, de sonhar, se tudo que quero, tenho?


Esta noite, seu sorriso ficou gravado em minha memória.


Adeus.


- Sean Anthony William  

domingo, 5 de junho de 2022

Melodia

 O que eu escuto são meus pés na poeira


as pedras quebrando e se mexendo sob minha sola, numa constância

eu reverbero música


cantando baixinho, cantarolando

as lágrimas já secas no rosto, mas nunca foram de tristeza


o sorriso está estampado, os olhos distantes, pensando em como eu vou chegar lá

um passo a frente do outro, as vezes devagar


eu te deixei pra trás, junto comigo


sigo novo, com a roupa velha, mas também penso em trocar

nada é mais, tarde demais

tudo dá-se um jeito, talvez torto, mas com certeza


eu não paro mais

a melodia que fica, são teus olhos

que me veem seguindo em frente


eu tenho um sorriso e meu coringa foi descartado

o que deixei de sentir, agora está guardado


pronto pra usar novamente. Talvez. 


Sempre talvez.